terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A crença

Saiu de lá com fé. Com muita fé em si mesma. No som do carro Bob Dylan a lhe acompanhar. Nos dias em que os pensamentos ensurdecem, ela aumenta o som para deixar a música sobrepor a sua dor.

Era curiosa a sua insistência em escutar "Don't think twice, it's all right " do seu mestre Dylan, mas precisava saborear cada trecho como se seu pensamento ainda não tivesse decodificado a mensagem daquela música.

Naquele dia, justamente ali, entendeu. Os seus caminhos não se cruzavam mais no infinito. "Não pense duas vezes está tudo bem" repetia em voz alta, naquela auto doutrinação.

Chorou. Um choro calado, quase consciencioso. Não chorava mais pelo desfecho das suas histórias. Chorava por si mesma e pelo tempo que ainda levava para entender como funcionavam as coisas do coração.

Apertou o volante e suplicou para não desacreditar no amor. Ela já não acreditava mais. Os seus sonhos haviam morrido ali naquele ponto final. Restava enterrá-los. Se permitiu em velar em silêncio, naquele luto solitário.

Sim, havia entregue o seu coração, mas sua alma jamais poderia oferecer. Um dia já tinha aprendido que a sua felicidade não podia ser entregue a ninguém. Mesmo assim o fez e mais uma vez se frustrou. Hoje era ela quem cuidava da idéia que ainda lhe restava por felicidade.

Algo de muito importante havia sido subtraído da sua essência. Decidiu buscar novamente. Era muito decidida. Não queria perder as esperanças, até desesperar. E foi.

Foi embora, não olhou para trás. Olhar pra trás representa insegurança. Não, definitivamente não estava insegura. A liberdade causava-lhe medo, mas queria essencialmente ser livre. E buscou. E está conseguindo. Mas ainda chora para limpar tudo o que resta daquele romance vivido por si só.


sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

a saga da mulher solteira - parte III

Também faz parte da saga da mulher solteira a famosa e maravilhosa dor de cotovelo. São momentos épicos, quase um ode à dor. Um ritual sagrado de culto à saudade. São momentos em que as lembranças chegam em avalanche e a pessoa degusta com prazer.

Tem que ter trilha sonora, claro. E quanto mais deprê mais o momento fica triunfal. Waldick Soriano sempre é boa companhia das dores dos desamores. Torturando esse ser que te adora, vamos desfrutando do nosso momento, só nosso. Acenda um cigarro e beba mais um gole. Momentos como esses são intensos e passam rápido.

Pelo direito nobre de roer. Roa ratinha solteira, o rei de Roma te deixou na sarjeta da solidão. No melhor estilo brega, aumente o som e viva a sua dor de cotovelo. Que mal faz uma roedeira? E quem nunca roeu que atire o primeiro copo.

Nelson Gonçalves que o diga. Mestre em cotovelos roxos ele vivia a dor com a beleza de um amante. Corria pra um botequim, cantava as mágoas de um caboclo solitário no regresso à boemia. Tudo na mais perfeita classe.

Mas seu mundo não caiu cara Maysa contemporânea, se avexe não cumadre, que a tampa da sua frigideira uma hora aparece. Mesmo que furada, um cacareco, é a sua tampa, do seu número, vai te servir muito bem.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

impaciência

Falta paciência. Há que se enfrentar tudo de novo. Necessário de certo, numa imensidão de tantas outras necessidades. Amadurecer. Amadurecimento à fórceps, nas quedas que a vida presenteia como quem tenta insistentemente ensinar com a dor.

Aquela estranheza de quem passou um tempo no escuro e a vista ainda está se acostumando com a claridade. Ardência. Incomodo. O novo assusta. É enxergar a vida de um novo prisma, mesmo sem compreender ao certo o que se passa.

Dançar conforme a música, dizia o velho adágio. Mudanças de ritmos por rotação de segundo. Tontura. Vertígio. Voilà a vida não espera.





quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

a cachaça nossa de cada dia

Perdoai as minhas cachaças. Assim como o fígado ofendido. Sempre me deixei cair em tentação. Mas livrai-me de toda a ressaca. Amém.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

a saga da mulher solteira - parte II


Uma das coisas mais deprimentes que a solteirice nos proporciona, minhas cumadres, é a tal da cantada mau sucedida. Aquelas que fazem a gente pensar que merecia um illustrator na edição do texto do bonitão. Incrivelmente ruins, nos remete a mais uma dúvida de tantas que o estado civil solteira nos proporciona: dar aquele fora que vem na ponta da língua ou respirar fundo e fingir que não é com você?

São tantas bizarrices que os filhos de Adão atiram julgando ser nossos ouvidos verdadeiros pinicos da vovó, que estou montando um glossário, digno de diário de campo de uma antropóloga que pretende fazer uma observação participante para análise etnográfica. Começo hoje um ensaio das três piores que escutei nos últimos tempos.

Cantada Djavan - Aquela que o cara pensa que está impressionando mas na verdade é um grande mico.
De madrugada eu já pagava a conta quando escutei:
- Solteira?
- Sim, mas fechada pra balanço.
- Eu posso ser o peso da sua balança!
Consideração 1 : de onde ele tirou que eu havia falado balança e não balanço?
Consideração 2: Presunçoso não?

Cantada Papagaio de Pirata - Aquela que pega carona numa determinada situação. Essa acontece bastante com mocinhas fumantes e sempre tem o álibi: me empresta teu isqueiro?
Foi assim que aconteceu numa noite em que eu e mais duas amigas bebíamos e fumávamos, não necessariamente nessa mesma ordem, com fortes intercaladas de boas risadas. Entre uma e outra baforada, o carinha disparou:
- Eu já pedi tanto o teu isqueiro que é melhor eu sentar aqui.
- De jeito nenhum querido.
- Jura por Deus?
- Juro por Deus, Maomé e Jeová.
Consideração Única: Ele mereceu o fora que levou.

Cantada Jonny Bravo - Quando o macho alpha se sente o gostosão, imprescindível, único, e entre tantos adjetivos é um grande paspalhão. Essa acontece quase sempre com metrossexuais, é incrível, mas é fato.
Eu estava dançando sozinha, quando me aparece aquele metro e me diz:
- Você merece alguém bonito como eu.
- ?????
Consideração Única: Fingi que não era comigo.

Dá pra tu? Aconteceu, virou manchete.